Articulação cultural agora é Lei
Sistema Municipal de Cultura é instituído em Pelotas com o objetivo de descentralizar e organizar o setor da cultura na cidade
Pelotas agora possui um Sistema Municipal de Cultura (SMC). Foi sancionada a lei 6.389, que institui princípios, estrutura e funcionamento de uma ação cujo objetivo é proporcionar uma maior organização no setor, para que haja condições ao exercício da cidadania cultural na cidade.
O SMC faz parte do Sistema Nacional de Cultura (SNC), modelo de gestão criado pelo Ministério da Cultura (MinC) para estimular e integrar as políticas públicas culturais implementadas pelos governos federal, estadual e municipal. Seu objetivo é descentralizar e organizar o desenvolvimento do setor no país, independentemente de governantes vigentes.
Para que seja instituído o SMC o município assina um termo de adesão ao SNC, se comprometendo a implantar a estrutura exigida pelo MinC. Em contrapartida o Ministério oferece apoio para o desenvolvimento de políticas culturais. O mínimo que a cidade deve ter abrange uma secretaria de Cultura, um conselho de política cultural, uma conferência periódica do setor, um plano de cultura e um sistema de financiamento. Destes, Pelotas ainda não possui apenas o Plano Municipal de Cultura e é essa, segundo a Secult, a meta para 2017.
Através da estrutura é garantido ao cidadão espaço para participar. O SNC é um processo que se iniciou em 2003 e, 13 anos depois, possui mais de 800 municípios cadastrados. No Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Santa Maria e agora Pelotas são as cidades que aderiram a ele.
Explica a gerente de projetos da Secult, Alessandra Ferreira, que o funcionamento do Sistema Municipal de Cultura é semelhante ao de outros setores, como o Sistema Único de Saúde (SUS). “É um conjunto de elementos que fazem acontecer a política pública cultural em nível nacional, estadual e municipal. Funciona a partir da articulação entre elementos do setor”, diz, destacando a importância de haver diálogo entre todos.
Alessandra diz que o SMC resulta em estratégias e ações para a área da cultura primeiramente sob a ótica do trabalhador, por conta da necessidade de haver o Plano Municipal de Cultura para que a cidade possa de fato ter o Sistema Municipal de Cultura. Dentro do plano estarão estratégias, indicadores, revisões e outras demandas pensadas para serem executadas nos próximos dez anos - além de governos, pois.
É também o SMC importante no que diz respeito ao acesso a recursos. As cidades que o têm estabelecido recebem verbas federais e estaduais “fundo a fundo”. Ou seja: do governo federal ao estadual e ao municipal sem burocracia no meio.
Para o cidadão
É de praxe na sociedade, não apenas pelotense, mas em todo o mundo, não enxergar os benefícios de ações do setor cultural público. Eles existem, embora por vezes passem longe do simples ganho financeiro.
Com o Sistema Municipal de Cultura não é diferente e Alessandra faz questão de destacar que, ao final do processo, é o cidadão em geral quem mais ganha. “Quantas coisas têm sido financiadas pelo Poder Público sem a cobrança? Todas as ações do Mercado Central, por exemplo, são financiadas com recursos da cultura. A gravação do DVD do Renascença, a Virada Cultural, fora atividades no âmbito escolar como o Tholl para Todos. O cidadão pode não saber, mas é beneficiado pelos recursos da cultura e por consequência pelo sistema”, argumenta.
Conferências
Para 2017 o objetivo é que se estabeleça o Plano Municipal de Cultura, elemento do Sistema Municipal de Cultura, que deve conter diagnóstico do desenvolvimento da cultura; diretrizes e prioridades; objetivos gerais e específicos; estratégias, metas e ações; prazos de execução; resultados e impactos esperados; recursos materiais, humanos, financeiros disponíveis e necessários; mecanismos e fontes de financiamento; e indicadores de monitoramento e avaliação. Seu objetivo é trazer um diagnóstico da cultura em Pelotas. “Se pega todo o histórico da cidade no âmbito cultural. Qual é a nossa condição, como e por que chegamos nessa condição. Depois se estabelecem as metas e os indicadores para avaliação do cumprimento”, explica Alessandra.
Nos próximos meses a Secult deve chamar os trabalhadores da cultura da cidade para a construção do plano nas chamadas pré-conferências territoriais, ações que já ocorreram durante 2016, mas que não obtiveram sequência por falta de fôlego da secretaria em meio a tantas demandas.
Segundo a gerente de projetos, o objetivo é retomar esse diálogo e mora exatamente aí a maneira com que os agentes culturais podem contribuir para a construção tanto de sistema quanto de plano: manifestando necessidades e prioridades que serão votadas em uma grande Conferência Municipal de Cultura a ser realizada em 2017. “Queremos que os agentes participem e provoquem esse chamamento em suas comunidades. É um documento que vira lei, assim como o SMC, e determina as metas do setor pelos próximos dez anos, algo que ultrapassa governos. É um documento de muita responsabilidade”, diz.
Demandas
Produtor na Gaia Cultura & Arte, Duda Keiber vê no SMC uma forma de potencializar ações, distribuir políticas públicas, agregar esforços e estruturas organizacionais e compartir recursos financeiros e humanos entre município, estado e país. “É importantíssima a adesão de Pelotas, já que o intuito é a gestão compartilhada e complementar, garantindo a participação da sociedade de uma forma mais eficaz e permanente.”
Sobre as necessidades do fazer cultural na cidade atualmente, Keiber pensa em cima de cinco elementos: agentes, saberes, investimentos, políticas públicas e equipamentos culturais. “Em Pelotas, os agentes são especialíssimos, pois há, em todos os segmentos, grandes atores e realizadores, e isto já faz parte da identidade da cidade. No que tange às políticas públicas, já existe um avanço importante, ao passo que uma das principais fontes de recursos para o desenvolvimento de projetos são os editais anuais do município e o Sistema Municipal, sancionado pela lei 6.389/16, irá fortalecer a cidadania cultural e as ações neste sentido”, diz.
Quanto aos equipamentos culturais, entretanto, o otimismo dá lugar à dúvida. “A cidade carece de um teatro público acessível a produtores, artistas e plateia, de uma universidade pública que também seja partícipe deste processo, embora existam ações como o Cine UFPel e a Bienal, e a comunidade cultural também tem que ser mais participante dos processos e debates, das conferências, dos encontros e do próprio Conselho Municipal, que neste formato, a meu ver, é pouco representativo justamente por causa desta omissão”, critica. “Mas estamos andando, e isto é lucro dentro do panorama nacional e estadual, onde a arte e a cultura são o primeiro ponto de corte quando se governa para interesses econômicos escusos, pois onde há cultura há saber, há paz e resistência, e isto parece um óbice aos planos governantes obscuros”, conclui.
Sistema Municipal de Cultura
Objetivos: proporcionar efetivas condições para o exercício da cidadania cultural a todos os pelotenses, promover o desenvolvimento humano, social e econômico e estabelecer novos mecanismos de gestão pública da política cultural - criando instâncias de participação de todos os segmentos sociais atuantes no meio cultural.
Fonte: Diário Popular - Por: Leon Sanguiné